quinta-feira, 21 de junho de 2012

A poética de uma vida.

                      As tardes eram sempre quentes e alegres.Não havia espaço para tristeza ou depressão.A vida não era fácil , nunca foi. Com a roupa molhada em suor , o rosto cansado e os olhos azuis de amor , meu pai chegava em nosso casebre depois de mais um dia de labor. Cumprimentava minha mãe , me olhava com o olhar de pai , que somente os pais olham. Apesar da fadiga , ainda tinha energia para brincar comigo e  rachar lenha para o fogão. De vez em quando me levava para passear na rua . Nós não morávamos em uma rua , nosso endereço era o morro. Descíamos as ladeiras de terra , caminhávamos pelas ruas de pedras. No boteco do Celinho Morais , do Silvério ou do Zico , tomávamos refrigerantes de um sabor nunca mais encontrado. Sabor que talvez hoje minha filha Maria Clara consiga sentir , e que um dia , quando eu não mais estiver escrevendo , ou escrevendo de outra forma em outro lugar , ela estará se lembrando como estou agora.
                     Andávamos pelas ruas , meu pai saudava as pessoas com o seu carinhoso boa noite Dim! Boa noite Dinha!Não corria riscos de esquecer o nome de ninguém . Sábio era meu pai que mesmo analfabeto criou um bordão chamado Dim ,  pelo qual era conhecido e cumprimentado até com brincadeiras de Dim vai dar pudim.Eu ainda não entendia o Dim vai dá pudim . Sempre deu pudim!Ao voltar para nossa mansarda , o caminho de terra no morro era dividido em um mais baixo para carros e outro mais alto para os pedestres. Nós apostávamos corridas como duas crianças. meu pai  devia sempre chegar em primeiro , afinal era e continuará sempre sendo meu grande herói.
                   Em nossa casa não havia luz elétrica . Nosso divertimento a noite eram as estórias e histórias de meu pai Geraldo e minha mãe Maria , além de suas narrativas , nos divertíamos também com os programas ouvidos em nosso rádio de pilha comprado em Aparecida do Norte  por alguém que meu pai encomendara.  Naquela época , a viagem mais longa que conseguíamos fazer , mesmo assim em casos de doenças , era até a cidade de Juiz de Fora. Aparecida do Norte para nós era outro mundo , muito distante de nossa realidade. Dormíamos cedo . Meus pais madrugavam , fizesse sol ou chuva , o ritual deles sempre se repetia de forma poética. A poética que até hoje busco , sinto e procuro viver com minhas poetas Sheila e Maria Clara , e a cada dia tenho mais certeza que por mais que eu tente e alguns até me considerem poeta , poetas mesmo foram meus pais , são minha mulher e minha filha.Eu apenas procuro  cantar a essência , a vivência , o encontro e o reencontro de tanto sentimento em uma única vida.

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